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Arte e vida: o olhar e a linguagem cinematográfica no contexto social

Este conteúdo foi elaborado a partir dos debates sobre a relação entre arte e vida realizados ao redor do filme, que reuniram, entre outros, nomes como João Moreira Salles, Jorge Furtado, Ismail Xavier, Esther Hamburger, Daniela Capelato e Ivana Bentes.

“Arte para mim é tudo. Sem arte, prefiro morrer” . É com essa frase contundente que Elena definia seus sentimentos e expressava seu desejo mais profundo: sentir, fazer, e viver de sua arte. Elena era uma jovem atriz de teatro e fazia parte do famoso grupo paulistano Boi Voador, coletivo de artistas voltado para a pesquisa de linguagens cênicas inovadoras, e disseminador do conceito teatro imagético – cuja ênfase está menos na fala e no texto, e mais na livre expressão dos movimentos.

Elena fez parte do elenco de Corpo de baile, peça que estabeleceu uma relação original e de movimento com a obra homônima do escritor mineiro Guimarães Rosa e teve grande repercussão na época. Mas nada disso parecia bastar e, na segunda metade dos anos 1980, Elena decidiu ir para Nova York em busca do sonho de ser estrela de cinema. Deixou para trás uma infância passada na clandestinidade dos anos de ditadura militar, a carreira no Brasil e deixou também Petra, a irmã de sete anos. Elena, ao partir para os Estados Unidos em busca de seu grande sonho, entrou no espiral da depressão e se suicidou.

“A arte ajudou a curar minha dor, me deu uma compreensão profunda de tudo o que aconteceu”, diria Petra Costa muitos anos depois, referindo-se ao seu primeiro longa-metragem, ELENA, sobre a morte prematura da irmã. Petra acompanhou a jornada percorrida por Elena para resgatar — e, de certa maneira, explicar — as frustrações e angústias que arrastaram a vida da irmã para esse desfecho trágico.

Petra e Elena, cada uma à sua maneira, não dissociam arte e vida, ao contrário: é essa relação atávica que molda a trajetória de ambas. E molda também o documentário ELENA, que, nas palavras de Daniela Capelato, consultora criativa do filme, apresenta uma “co-extensividade entre o real e a imagem, entre o fato e o espetáculo. [O filme] É o ‘teatro da vida’, onde Petra representa Elena, Elena representa Petra e Li An (a mãe) representa Elena, até que ‘tudo vira água’, vira filme ou memória, como diz uma das personagens do filme: ora protagonista, ora coadjuvante, ora diretora, ora atriz”.

“O cinema dá a impressão de que é a própria vida que vemos na tela, brigas verdadeiras, amores verdadeiros”, diz o crítico e teórico de cinema Jean-Claude Bernadet, em seu livro O que é cinema (Brasiliense, 1985). “Mesmo quando se trata de algo que sabemos não ser verdade, como o Pica-pau Amarelo ou O Mágico de Oz, ou um filme de ficção científica como 2001, Uma odisseia no espaço ou Contatos imediatos do terceiro grau, a imagem cinematográfica permite-nos assistir a essas fantasias como se fossem verdadeiras; ela confere realidade a essas fantasias”, completa ele. Assim, uma das características principais da linguagem cinematográfica é despertar o sonho, a fantasia, a vivência de uma experiência pelas telas. E nesse sentido, atua da mesma forma tanto em filmes documentários, como em filmes de ficção.

Assim, ELENA contribui para discussões sobre a relação entre arte e vida porque:

− coloca em questão as relações entre verdade e encenação, e imagem e real presentes no documentário.

− evidencia possibilidades de uso e função social da arte, como o estímulo ao pensamento crítico sobre a linguagem do cinema, a abordagem e discussão de temas socialmente delicados, e a elaboração do luto pela arte.

− expõe as dificuldades da carreira de artista.

Para aprofundar esses temas, acesse os eixos de discussão abaixo e os materiais relacionados:

Eixos de discussão:

1) O estatuto do documentário: verdade ou encenação?

O documentário ELENA é uma história familiar, íntima, mas é também uma construção cênica. Ao reconstruir a memória de sua irmã a partir de seu olhar e da linguagem cinematográfica, Petra coloca seu filme (e a si mesma) entre o encenado e o não encenado, entre a verdade e a representação dessa verdade. Para João Moreira Salles, ELENA resgata os primórdios do gênero documentário ao questionar a relação entre o real e a imagem.

2) O íntimo, o político e a função social da arte

ELENA, ao discutir temas tabus do universo feminino e da saúde mental, bem como retratar alguns dilemas subjetivos da juventude e referentes às dificuldades físicas e emocionais do artista, transporta assuntos do mundo privado para o espaço público e cria ambientes coletivos de discussão e diálogo sobre questões socialmente delicadas e polêmicas. Além disso, se distancia do cinema brasileiro documental contemporâneo, que em geral privilegia temas polêmicos e de denúncia, relacionados a certa “realidade crua” – como a pobreza, a corrupção, a condição de minorias etc. Ao retratar um mundo íntimo, privado, ELENA escolhe outro caminho para seu filme, como outros documentários pessoais da última década (Diário de uma busca [2011], de Flavia Castro; Santiago [2007], de João Moreira Salles; 33 [2003], de Kiko Goifman; entre outros). Mas deixa, por isso, de ser político?

Materiais relacionados:

Elena no elenco da peça Corpo de baile  – Trechos do filme em que Elena aparece atuando na peça inspirada em livro homônimo de Guimarães Rosa.

Documentário: verdade ou encenação?  – Comentário de João Moreira Salles no debate “ELENA e a perspectiva da encenação”, realizado no Itaú Cultural.

Documentário: o íntimo é político? – Comentário de João Moreira Salles no debate “ELENA e a perspectiva da encenação”, realizado no Itaú Cultural.

“ELENA e a perspectiva da encenação” – Íntegra do debate no Itaú Cultural, em São Paulo, com o cineasta João Moreira Salles e a diretora Petra Costa. Mediação: Daniela Capelato.

“A arte para mim é tudo” – Os atores Letícia Sabatella, Maria Flor, Heloísa Benicchio, Tatiana Ribeiro, Júlia Lemmertz e Alexandre Borges contam o que sentiram ao assistir ao filme.

“O filme pode ter um caráter terapêutico” – Reflexão da ensaísta e teórica da comunicação e cultura Ivana Bentes sobre o filme, durante o debate “O uso político e social da arte”.

“É preciso pensar o suicídio como uma questão de saúde pública e prevenção” – Alerta do psicanalista, filósofo e pesquisador da Fiocruz Carlos Estellita-Lins ao falar sobre o filme no debate “O uso político e social da arte”.

“O uso político e social da arte” – Íntegra do debate “O uso político e social da arte” realizado no teatro Sério Porto, Rio de Janeiro, com a presença de Ivana Bentes, Carlos Estellita-Lins e a diretora Petra Costa.

As dificuldades da carreira de artista  – Trechos do filme em que Elena passa por uma entrevista de casting, e também trechos da fala de Martha Kiss Perrone,  diretora de arte e preparadora de elenco de ELENA, durante o debate “Tornar-se mulher”, no MIS, evidenciam as pressões e dificuldades sofridas pelos artistas.

“Aquilo que não se liquefaz” – Debate sobre o filme ELENA no Departamento de Cinema, Rádio e TV da ECA, em parceria com o Cinusp, com a presença do crítico e teórico de cinema brasileiro Ismail Xavier, a professora e pesquisadora de audiovisual Esther Hamburger, a diretora Petra Costa e a roteirista Carô Ziskind.

“A poesia de ELENA”– Bate-papo sobre o filme realizado no Centro Cultural Contemporâneo B_arco, com a presença de Aleksei Abib, consultor de roteiro para o filme, e a diretora Petra Costa.