O Globo fala sobre ELENA
10 de maio de 2013

RIO – Em “Elena”, a cineasta Petra Costa tem o “prazer” e a “dor” de recontar a curta história da irmã, uma jovem que parte para Nova York aos 20 anos com a vontade de ser atriz de cinema, mas que acaba morrendo de uma maneira trágica. Para tratar de um assunto delicado, a perda, a diretora fez dezenas de entrevistas com familiares e amigos e analisou mais de 50 horas de vídeos caseiros acumulados desde os anos 1980.

O resultado gerou elogios e alguns prêmios. Definido como “uma das experiências mais agudas que eu já vivi no cinema” e “um filme que provoca 60 insights por minuto” por Walter Salles e Fernando Meirelles, respectivamente, “Elena” venceu quatro prêmios no Festival de Brasília do ano passado, incluindo melhor documentário pelo júri popular.

— Foi lindo e doloroso descobrir o maior valor daquilo que eu tinha perdido. Ao mesmo tempo em que eu a ganhava, eu a perdia de novo. Eu tinha uma imagem muito mais simples dela. Era uma lenda. Descobri várias facetas dela que não conhecia — conta Petra, que tinha 7 anos quando Elena, no fim dos anos 1980, viajou para os Estados Unidos, insatisfeita com o mercado cinematográfico brasileiro.

Em depoimentos gravados e enviados à família no Brasil, a irmã mais velha relatava as frustrações típicas de quem entra no mundo das artes, como a dificuldade para arrumar papéis. As decepções deram início à depressão.

O documentário aborda esse período em pinceladas que se alternam entre o objetivo e o abstrato. Além de diários e gravações, Petra recorre a encenações para resgatar a memória da irmã – ela atua em algumas cenas – e a imagens compostas pela sua equipe de editores e fotógrafos.

— Eu tinha a intenção de criar uma história em que você mergulha e se identifica com os personagens, passa pela transformação junto com eles. Queria que as pessoas sentissem a apreensão que minha mãe, eu e a Elena tivemos. A gente buscou a estrutura de um filme de ficção — explica Petra.

É o primeiro longa-metragem de Petra Costa, mas não a primeira imersão no universo íntimo. No curta “Olhos de ressaca”, de 2009, ela esboçou um retrato sobre o envelhecer do ponto de vista de seus avós.

— Desde o começo, nas minhas experiências no teatro, eu sentia que o que tinha mais força artisticamente era o que vinha da intimidade — pondera.

É uma exposição na qual a mãe dela, uma das personagens mais presentes do filme, também topou embarcar. Ela acompanhou a filha cineasta em sua tentativa de refazer a trajetória de Elena. Foi em 2010, em Nova York, quando começaram as gravações do documentário – rodado com um filme Super-8, uma câmera DSLR e um iPhone.

Formada em Antropologia no Bernard College, Columbia University, Petra trabalha profissionalmente como atriz desde os 15 anos. O interesse pela carreira artística implicava seguir passos parecidos com os da irmã, o que foi uma preocupação grande para a mãe e para ela própria. Ambas tinham medo que o desfecho trágico da vida de Elena uma semana antes de completar 21 anos se repetisse. Assim, passar dessa idade foi um divisor de águas – um “alívio”, como Petra define.

— Pensei em abandonar a carreira artística e seguir a acadêmica. Optei por continuar trabalhando com cinema mesmo. Mas esse tempo foi importante. Um tempo que a Elena não teve. O que aconteceu com ela aconteceu no momento mais difícil, o da juventude, quando tudo parece que é para ontem.

Para a diretora e roteirista, o filme não é exatamente uma homenagem, e tem, principalmente, o objetivo de mostrar que é possível tirar algo positivo da ausência.

— É uma história que valia a pena contar. Tive o desejo de tirá-la do mundo dos esquecidos, fazer com que a Elena voltasse à memória — reflete. — As pessoas saem inspiradas a também fazer uma obra artística sobre suas próprias Elenas, suas memórias inconsoláveis. O que mais me motiva a levar o filme para debates é que se fale mais sobre as próprias perdas. Elas viram uma fonte de inspiração.

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