Quero ver Petra sorrir

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Em seu blog na página online do Estadão, o escritor Marcelo Rubens Paiva, que conheceu Elena na juventude, escreveu sobre ela, sobre o filme e sobre os pontos comuns que ELENA tem com sua própria história.

Leia, abaixo, a íntegra de sua coluna.

“Existem 2 caminhos na encruzilhada da tragédia pessoal: fugir dela ou enfrentá-la.

Muitos optam por esquecer, superar, virar a página, seguir em frente.

Outros preferem cutucar em todas as feridas não cicatrizadas e descobrir se há motivos para as peças aprontadas pelo destino.

ELENA, o filme, que estreia sexta, é fruto da coragem de enfrentar um drama pessoal, dolorido, e de não guardá-lo para si, nem esquecer.

PETRA COSTA, irmã de Elena, a diretora, resolveu entender aquela marca no passado, que mudou a vida dela e de toda a família: o suicídio da irmã.

Elena Andade era a mais linda de todas. A conheci quando tinha menos de 20 anos. Era a mais gata da escola, a que melhor dançava, representava. Filha de uma família de ex-militantes do PCdoB, perseguida na Ditadura, que fundava o PT, comandava um jornal e uma revista, em que trabalhei, Elena era pós-hippie, sedutora, ousada, livre, sorridente. Daquelas garotas que, quando chegam, todos notam.

E vivia o sonho de um novo Brasil, que se abria e se libertava.

Se mudou para Nova York para estudar teatro. Se alguém daquela turma deveria fazer teatro, era ela.

Então, chegou a notícia que tirou o chão de todos que a conheciam.

Ninguém entendeu a sua morte. Os últimos com quem ela conversou pelo telefone diziam que ela estava deprimida, solitária. Mas ninguém suspeitou que ela chegaria aonde chegou.

Marília, sua mãe, foi amparada pelos amigos. A tentação de entrar num labirinto de culpas era enorme. Foi militar, trabalhar com jovens.

E Petra, uma criança, cresceu, cada vez mais se parecia fisicamente com a irmã.

Sorria pouco, falava com uma voz baixa, parecia tímida.

Parecia uma adulta num corpo de adolescente.

Parecia carregar um peso nos ombros.

Era inquieta e curiosa.

Foi fazer teatro como a irmã. Aqui na PUC – SP. Foi fazer Cinema. Foi morar fora. Na Europa. Depois em Nova York, como a irmã. Foi desvendar a irmã.

Para, através do exercício da procura, entender o mundo e a si mesma. Para entender a vida, relendo a morte.

Fiz o mesmo em Feliz Ano Velho e Não És Tu Brasil, livros em que, indisfarçavelmente, procurei entender o que tinha acontecido com meu pai.

Entendo [e admiro] o que a pequena PETRA fez. Quando me disse que faria um documentário sobre a irmã, eu a abracei e disse: “Vai fundo!”

Ela foi. Dentro daquela menina tímida, tinha muita força e coragem acumulada.

Quero ver PETRA sorrir agora.”

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