Filme “Elena” traz diretora em busca da irmã e da própria identidade

Mário Barra, no UOL Entretenimento Cinema – 10/5/2013

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Investigar sobre uma pessoa próxima e descobrir no fim do aprendizado um espelho para a própria alma é uma das ideias que Petra Costa desperta em quem assiste ao documentário “Elena”. Criado para falar sobre a irmã mais velha da diretora, que morreu nos Estados Unidos, o longa conta com um só nome, mas retrata mais de uma pessoa.

Uma história de suicídio é tratada de forma sutil e artística para recontar a trajetória de Elena Andrade, uma atriz no início de carreira, que foi tentar a sorte na América do Norte, onde um dia se encontrou até mesmo com Francis Ford Coppola. Petra, a caçula que admirava a irmã, tinha apenas sete anos quando a mudança aconteceu. E desde essa idade até os 29 anos atuais, a cineasta lida com a lembrança da parente, encontrada pela própria mãe sem vida em um apartamento em Nova York em 1990.

Concebido como se fosse uma carta em áudio e vídeo de Petra para Elena, o longa traz uma narração que utiliza muito das palavras trocadas em vida real entre a irmã mais velha e a nova, como se transmissão de ensinamentos fosse repassada e a diretora reconhecesse que, de fato, assimilou as lições. Com Elena, Petra fez muita coisa pela primeira vez: dançou, cantou e até atuou nas filmagens caseiras que tinham a própria irmã mais velha como diretora.

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Mas além de retratar a saudade e retomar o trauma da perda súbita de uma jovem talentosa, a opção de Petra por encenar os passos dados pela irmã na metrópole norte-americana permite ao espectador entrar no cérebro da diretora e sentir, de alguma forma, a sua dor.

Não é a toa que a diretora é testemunha dessa identificação, provada nos depoimentos que recebeu depois de sessões anteriores do filme, que foi premiado no Festival de Brasília em 2012 nas categorias de documentário e elogiado por cineastas como Fernando Meirelles e Walter Salles. Atores como Wagner Moura e Alexandre Borges também colaboraram com a divulgação do longa, que contou com um vídeo no qual os artistas falam sobre Elena.

Um trunfo do filme foi Petra convencer a própria mãe a retornar ao bairro e ao apartamento onde Elena morreu no exterior. A mãe de Elena e Petra acaba se transformando em um terceiro elemento do longa, com sua própria versão dos fatos, pesar no olhar e dores no peito. É ela quem revela os detalhes da vida de Elena em Nova York, uma jovem ora desiludida com testes sem sucesso, ora eufórica com a proximidade dos parentes.

PROGRAMA “METRÓPOLIS” FALA DE “ELENA” EM 2012

Mas a diretora não se detém com tentativas de explicação ou de compreensão. O filme, definido pela própria autora como uma manifestação de arte, se envereda por sugestões, palavras soltas e mensagens ao pé do ouvido, sempre com o objetivo de enriquecer o espectador com imagens e sons sobre Elena. Não se deve esperar do longa uma análise racional e descritiva em excesso sobre os motivos para Elena ter partido.

Uma prova é foco particular que dado à dança no documentário, que aparece como um elemento particularmente cativante, como se fosse uma versão artística das ânsias e dos sentimentos de Petra. Seja por meio das performances da própria Elena, registradas no material em vídeo consultado por Petra durante a pesquisa para o filme, ou pelo balé aquático orquestrado para relembrar a personagem Ofélia, de Shakespeare, o movimento do corpo é constante na tela.

E se o movimento corporal é detectado na tela, é possível que ele simbolize o próprio rito de passagem por qual passa Petra. Depois de anos de terapia, lembranças e, agora, um filme, talvez a dança seja a metáfora mais poderosa para representar que, afinal, Elena pode seguir em frente e se ver livre. E a diretora também, ainda que sempre unidas de alguma forma complexa demais para palavras, mas por vezes captável pela arte.

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