Elena. Um Filme de Arte.

por: André Custódio é editor do MeGAntena – 16/5/2013

Aqui no MeGAntena já estou chamando a atenção para o filme Elena – lançado no final de semana passado nos cinemas – há algum tempo.
Desde o ano passado acompanho o caminhar do filme/documentário e pelo o que mostrava já prometia algo único.

Fui na pré estreia ver, finalmente, o filme de Petra Costa. É arrebatador.

Por mais que você tenha ouvido falar ou lido alguma coisa sobre o filme da Petra – que tive o prazer de conhecer e conviver durante o processo do espetáculo de teatro Suburbia – nada vai substituir a experiência de assisti-lo.

Recomendação forte, vá ao cinema ver Elena.

Saí da sala escura e não conseguia parar quieto se não escrevesse sobre ele.
Escrevi para Petra e hoje aqui no [ Quinta Escrita ] coloco pra vocês o que enviei para ela.

* * * * *
Elena. Um Filme de Arte.

Fui ontem na pré estreia no Itau, tive que ir embora antes de terminar o debate, não deu pra te dar um oi, mas não pude deixar de escrever minhas impressões.
De cara já falo, fui surpreendido.
Ao longo do lançamento, com trailer, teaser e os depoimentos, tudo me levava acreditar ser uma revisita poética na memoria de uma família de três mulheres, buscando resgatar a apaixonante figura da irmã mais velha. Quem sabe tentando encontrar algumas respostas, amparo ou libertação. Uma conversa de despedida entre três musas do tempo.
Mas o que eu vi foi muito além desse enredo.
A carga simbólica do filme se sobressai a história real das personagens, para mim até mesmo de suas possíveis histórias ficcionais. Apesar das primeiras camadas serem desse núcleo familiar, filme fala mais alto e mais longe.

No filme vocês todas se tornam um ser só, o Artista.
Com a história real servindo de coluna, centro nervoso e depois vestida de músculos e pele de ficção, este ser criado, o Filme Elena, fala essencialmente, sobre arte!
Vejo pelo menos duas camadas que se dialogam com a arte e com as quais nos identificamos, uma mais evidente e outra uma resposta.

O processo de formação de um artista é tomado ao longo do tempo por várias fases.
Antes de tudo acontece um chamado simples e sutil para olhar o mundo de forma mais crítica e/ou delicada. É a dança de Elena. Ela dançava um canto de sereia.
Depois vem a fase de juntar pra si, ainda que intuitivamente, as coisas que lhe falam ao coração, as músicas, os filmes…Frank Sinatra.

Chega uma hora que tem que deixar de ser “brincadeira”, é nessa hora que vamos ao ofício do artista. Seja ele qual for. E são muitas as escolas, os métodos, as linhas, os dogmas, e depois de “encontrar” seu caminho em meio a tudo isso, agora é só trabalhar.
Vemos Elena passar por isso.

Mas e aí? Trabalhar?
Como ser um artista lá fora? Como ser o artista revolucionário, poeta e contundente que estudamos sempre? Cadê? Ficar a mercê dos convites para entrar em espetáculos, na tv ou no cinema? Todo artista faz sua parte, não pára de se desenvolver e vai atrás, teste após teste após teste. Não é fácil, todo artista faz isso. Mas não, não é fácil.

Tem duas coisas que falo muito quando me perguntam sobre minha carreira de ator; que uma coisa é o ofício do artista e outra bem diferente é seu mercado
O artista se abre muito, se abre todo. Quando vai de verdade para o mundo, a realidade o intoxica. É o veneno. O que Elena se envenenou.

O filme tem esse embate de Elena com a realidade da arte, essa inadequação que todo artista experimenta em algum momento. Essa é nossa identificação evidente.

Quando se experimenta o turbilhão da realidade que engole, uns se convertem em outro elemento e passam rápidos por cima, outros nunca conseguem, e tem aqueles que correm com o rio. Aqueles que não deixam de falar o que querem e entram no fluxo corrente com propriedade.

Isso Petra, é seu filme.
Sua obra, o Elena, não deixa de ser uma resposta para a realidade.
Você fez, juntou os que tinha e fez. Considero isso como o verdadeiro caminho de se fazer arte hoje em dia. Sempre foi assim, mas digo a arte competitiva, com poder de se inserir no mercado. É uma resposta a realidade, por você e por Elena.
Através do filme você resignifica os embates de Elena e a transforma numa heroína grega.
Com o Elena você responde ao veneno da forma mais delicada e fatal. Petra samurai.
Durante o filme se apertou demais meu coração tamanha era a identificação com as aventuras e desventuras de Elena, e ela morre.

E aí Petra no filme se pergunta: E eu nisso tudo? Qual meu papel?
A segunda parte do filme nós vamos com você, e a identificação muda de Elena eternizada para Petra que fica, liberta no mundo, pronta pra contar mais histórias.
Lembrando que quando Elena morre você, Petra, estava na escola. Aprendendo.
Você cresceu, aprendeu e mostrou um belíssimo filme.
Obrigado.

Ps:
Eu que conheci a sua mãe e também a você, ainda mais jovem no final do ano 99, passando para 2000 durante os ensaios de Suburbia. Foi impactante imaginar “conviver” com vocês num momento tão delicado – na verdade tudo parece ter sido muito delicado – em que sua mãe disse ontem, durante o debate, que na virada para o novo milênio, nos pedidos para o que viria, ela de olhos fechados pensou em Elena, quando sentiu sua presença na frente dela, encostando sua testa na dela. Naquele momento “acabou o luto”, acabou porque ela percebeu que a cada momento presa a Elena ela deixava de aproveitar o presente da Petra.
Elena acho que também é isso, um presente entre vocês. Parabéns pela aventura.
Beijão

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