Dançando com a lua

por: Bruno Galvão – blog Mag – 16/5/2013

 

Muito difícil definir com palavras as sensações vividas ao assistir “Elena”, 2013, Petra Costa. Este longa-metragem de incontáveis qualidades é essencialmente, um filme sobre a memória. O que seríamos sem nossas memórias? Segundo Luis Buñuel, “uma vida sem memória não seria vida. Nossa memória é nossa coerência, nossa razão, nossa ação, nosso sentimento. Sem ela, não somos nada.”

Narrado em “primeiríssima pessoa”, “Elena” é uma história familiar capaz de comover qualquer ser-humano. `A mim fica claro que a diretora, Petra Costa, fez um filme para sí mesma. Na busca de sua irmã, Elena, elas parecem se confundir. Parecem ser a mesma pessoa. Tenho dúvidas, caríssimo webleitor, se “Elena” se enquadra na classificação de um filme de “não-ficção”. É um documentário que conta com imagens de arquivo e depoimentos, é verdade, mas o que o diferencia de quase tudo o que já foi feito, são suas imagens poderosas, donas de uma beleza magnetizante. O texto, de ritmo envolvente, parece poesia. Principalmente quando é recitado na voz envolvente de Petra Costa. “Poderia fechar os olhos, e escutá-la falar durante um ano inteiro”, me disse um amigo na saída da sessão.

“Elena” é uma junção rara de componentes únicos. Tudo funciona. Por mais que Jean-Luc Godard colocasse a câmera no lugar certo, “Acossado” não seria “Acossado” se não existisse Jean Seberg. Da mesma forma, “Elena” só é “Elena” devido a voz de Petra Costa. Fundamental para a história.

Uma das questões mais profundas tratadas pelo longa-metragem é a vocação artística. Elena não conseguia seguir em frente com seus dilemas pessoais. Isto porque para um artista, a arte não é uma forma de ganhar a vida. Mas sim, uma maneira de respirar. De enxergar. De sobreviver ao “mundo paralelo à arte”. Pois como bem definiu Pablo Picasso: “A arte é a mentira que nos permite conhecer a verdade.”

Na tentativa de tentar entender o que se passou pela cabeça de Elena, cito uma belíssima passagem de Ingmar Bergman, ao declarar seu amor pelo teatro: “Às vezes, nas horas silenciosas do teatro, entre os ensaios e a apresentação, sento-me no meu lugar, permito-me ficar nostálgico e sinto a cada pulsação que esse local desajeitado e antiquado é meu verdadeiro lar. Essa grande sala que descansa em silêncio e na penumbra é – decidi escrever após muita hesitação- o começo e o fim, e quase tudo entre os dois. Essa ideia parece exagerada quando posta em palavras, mas não encontro formulação mais apropriada, por isso fica assim: o começo e o fim, e quase tudo entre os dois.”

Todo amor que que Petra Costa tem por sua irmã transborda pelas imagens que saem da tela do cinema. Elena, dança com a lua. Um filme que muda uma vida.

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