Em busca do próprio corpo

Eliane Brum - blog da revista Época - 6/5/2013

Um filme muito lírico

Rubens Ewald Filho - Portal Pepper – 29/5/2013

Vamos flutuar

Jordan M. Smith - IonCinema – 1/5/2013

E se o que Elena deseja ainda não tiver nome? –

Por Flávio Ricardo Vassoler – colaborador do Portal Heráclito

Quando o Príncipe Míchkin, protagonista do romance “O idiota”, vaticina que “a beleza salvará o mundo”, leitores apressados e/ou detratores da obra do bom e velho Fiódor Mikháilovitch Dostoiévski tendem a lhe atribuir laivos inequívocos de idealismo e ingenuidade — como se o criador do homem do subsolo (“Memórias do subsolo”) e de Raskólnikov (“Crime e castigo”), de Nastácia Filíppovna (“O idiota”) e Kiríllov (“Os demônios”), de Hippolit (“O idiota”) e Ivan Karamázov (“Os irmãos Karamázov”) não conhecesse a intrincada via crucis para a cicatrização do espírito humano.

Na verdade, a beleza a que Míchkin se refere diz respeito ao (re)encontro do estético com o ético. Ora, se concebermos a ética como o conjunto de valores e ideais que partilhamos (ethos), a redenção do ético pelo estético só pode se dar pela cicatrização so-ci-al do ethos. Nesse caso, o suposto quietismo ingênuo de Míchkin se transforma em um libelo contra o choro e o ranger de dentes historicamente (re)produzidos.

E eis que, lá pelo início da “Teoria do romance”, o bom e velho György Lukács, antes de sua conversão ao marxismo eclesiástico, propõe uma tipologia para compreendermos a interação das personagens com o mundo. Assim, há personagens que só fazem sofrer com temores e tremores, personagens que se sentem inequivocamente acossadas pelo colosso do mundo, personagens que não conseguem carregar sobre os ombros esguios aquilo que um poeta itabirano padeceu como o sentimento do mundo. (Os leitores d'”A metamorfose”, do bom e velho Franz Kafka, logo vão se lembrar do fatídico quarto-cárcere de Gregor Samsa.) Por outro lado, há personagens que parecem engolfar o mundo, personagens cuja inadaptação aos valores e ideais vigentes apontam não para um problema propriamente individual, mas para as profundas aporias do atual estado de coisas. Voltemos a mencionar, então, o Príncipe Míchkin. [Antes que alguém acuse o jovem Lukács da “Teoria do romance” de simplificação do caos do mundo — acusação que o próprio Lukács, a posteriori, transformaria em autoacusação em um longo prefácio revisionista –, podemos considerar esses dois tipos ideais (personagens menores e personagens maiores do que o mundo) como as balizas extremas em meio às quais haveria uma série de personagens radicalmente híbridas. A crítica ao jovem Lukács, a bem dizer, deveria se voltar aos limites do pensamento tipológico, dicotômico — e não dialético.]

Pois muito bem: a mineira Petra Costa, diretora e pessoa/personagem do filme “Elena” (2012), nos apresenta sua irmã mais velha, a atriz sonhadora e sequiosa que dá nome ao documentário ao longo do qual a tese da ficção e a antítese da realidade, umbilicalmente narradas, dão vazão à belíssima síntese da realidade ficcional.

Elena é muito maior do que o mundo. Eu imagino o momento em que Elena, potencial leitora de Clarice Lispector, entreviu seu espírito nu quando a escritora lhe sussurrou que “o que eu desejo ainda não tem nome”.

Diferentemente daquilo que o ethos burguês dos EUA apregoa — Elena vai a Nova Iorque para tentar se tornar atriz de cinema –, não conseguir viver de e em sua arte, para a irmã de Petra Costa, não significa ser uma “loser”; para muito além da corrida de cavalos a que o capitalismo nos coage, não conseguir viver de e em sua arte significa, para Elena, a impossibilidade de (tentar) trazer à tona todo o turbilhão anímico que, depois da nossa expulsão do Éden de Neverland, somos obrigados, com a boca torta pelo ressentimento, a chamar de “sonhos”.

Com uma voz algo rouca e um sotaque bem mineiro que dão ainda mais compasso (e feitiço) poético(s) à narração, Petra Costa como que nos conta que a impetuosa Elena, uma vez ultrapassada a fronteira do desejo, já não podia voltar ao quarto-cárcere de Gregor Samsa.

Para Elena, apenas a beleza salvaria o mundo.

Mas, ora, é preciso saber — saber contra os próprios sonhos — se o mundo está disposto a salvar a beleza.

Tataraneta de Zaratustra, Elena encarna a noção de que a maturidade do adulto só se alcança com a recuperação da seriedade da criança ao brincar. Assim, Elena leva às últimas consequências um aforismo-só-lâmina do bom e velho Oscar Wilde, para quem todos aqueles que vão abaixo da superfície o fazem por sua própria conta e risco.

Os leitores de “De Profundis” sabem o que, ao fim e ao cabo, acontece com Oscar Wilde.

Os leitores de “O idiota” sabem para onde a via crucis do cristão Míchkin o leva, quando o dostoievskiano tenta conciliar a tese do perdão ao assassino com a justiça para com a assassinada.

Aqueles que acompanharem a cadência mineiro-poética da narração de Petra Costa descobrirão por que a máscara grega de Elena é o rosto da tristeza.

“Elena” é não apenas uma profunda investigação sobre a natureza do belo — o belo não cicatrizado, o belo que faz a memória doer. “Elena” é a consecução do sonho da mãe de Elena; “Elena” é a realização do sonho de Elena; “Elena” é a cura que a diretora e pessoa/personagem Petra Costa propõe à inquieta Electra — aquela que, ao fim e ao cabo, acaba engolfando sua amada irmã. (Um espectro ronda “Elena”, o espectro do Dr. Freud.)

 

Flávio Ricardo Vassoler é doutor em Teoria Literária e Literatura Comparada pela FFLCH-USP, com estágio doutoral junto à Northwestern University (Evanston, EUA). É autor das obras literárias O Evangelho segundo Talião (nVersos, 2013) e Tiro de Misericórdia (nVersos, 2014) e organizador do livro de ensaios Dostoiévski e Bergman: O niilismo da modernidade (Intermeios, 2012).

Elena – Entre o âmago da arte e a ternura de uma busca vã por Emerson Lima

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Quem é Elena?

Parte I – O âmago da arte

O homem procura a eternidade até mesmo no último suspiro. Direciona suas crenças para mundos diferentes, melhores ou piores que o nosso, mas, sempre, diferente. Como se o “aqui” não refletisse, totalmente, as suas necessidades, como se o “agora” não bastasse para aliviar o coração.

O que seria o normal? Chegar ao entendimento do que é arte é tão ambíguo quanto compreender o significado da vida. Há diversos espaços, há diversas oportunidades, há diversas ações e histórias, sempre percorrendo a arte ou acrescentando fragmentos de informações à ela. Um ser vivo é parte de um todo e esse todo é parte de um mistério; Simples como desvendar a morte, incrível como acreditar no impossível.

Eu percorri diversos pensamentos sobre a minha pessoa, me consumi na obrigação de me encontrar, acreditei estar sozinho e quanto mais prestava atenção, mais afundava. Acreditar nos meus limites era quase uma imposição do mundo, superar esse obstáculo e me enxergar como um ousado era um trabalho para uma outra vida, um outro encontro e uma outra causa. Até que repensei a arte como um veículo, como um cavalo levando seu cavalheiro à encontro dele mesmo. Eu, que me apresentava como o senhor ninguém, cuja imagem sempre era transmitida de forma borrada, assumia a posição de criador mas, acima de tudo, admitindo, sem nenhum problema, que só conseguia o ser pois um dia eu fora criatura.

A arte é o encontro, entre todas as criaturas e sentimentos que existem dentro de apenas um ser humano, é o movimento das águas, o vento que balança uma árvore, é a sincronia e aceitação do ciclo, da mudança, do tempo. A arte está em tudo e no mesmo tempo não existe, assim como o fim, é uma criação do próprio homem para dar sentido à coisas inexplicáveis.

Quem é Elena? Uma excelente representação, de um centro do mundo. De uma existência única que, para mim e para você, permanece desconhecida, senão, pela arte, pelo olhar. Nunca conheceremos Elena, conhecemos, após assistir o documentário da Petra Costa, o olhar que a diretora tinha (tem) sobre sua irmã. Quando a arte atinge uma simbiose, uma sincronia, uma visceralidade no que diz respeito a fusão de histórias, interesses, sentimentos, dores e ausências. Petra Costa é sua irmã, Elena. A mãe assume, por vezes, a vida de Petra, outra de Elena. Elena é lembrada e, por isso, continua viva. A intenção e necessidade dessas três protagonistas de uma história orgânica, ultrapassa os limites do cinema e atinge o coração de cada espectador que, por algum motivo, em algum momento, conflitou com a melancolia.

A priori toda arte deveria ser consequência do despimento, rompimento, caos e tenuidade. Transformando assim os seus personagens ou objetivo, seja no cinema, música, escultura, desenho etc, em ruídos. Aquela confusão criada a partir de um não entendimento, aquela sensação provinda de um movimento minucioso, aquela provocação por sentir a harmonia partindo de uma busca sem resposta.

Quem é Elena? Elena é um ruído, uma imagem embaçada que se torna crível tanto pelo seu elo com a arte, como pela desmistificação que sua irmã faz através de uma série de narrações em off, dialogando perfeitamente com as imagens de arquivo, ora sem sentido como um balançar de mãos, ora uma dança, mas gritando nas entrelinhas, constantemente, que apenas a dor da ausência é que faz sentido.

Parte II: ternura de uma busca vã

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A busca vã é a falta de capacidade de se esconder diante a verdade. As pessoas tem dificuldade em aceitar a morte e lidar com o luto quando, na verdade, deveríamos todos ter força para utilizar isso como catarse, transformar o desespero em soluções, eternizar a angústia, de forma a trabalhá-la constantemente.

Infelizmente não temos essa capacidade, a ideia de finitude nos consome, existe um mergulho profundo na obscuridade do tempo. Ele, de repente, em um dia chuvoso, sussurra nos nossos ouvidos que falta-nos pouco para concretizar aquilo que realmente queremos. Mas em nenhum momento podemos deixar de viver de forma mecânica para seguir nossos reais interesses, seja por conta da sociedade, necessidade ou status.

Elena encontrou no tempo uma oportunidade. Queria ser atriz e procurou se especializar aos olhos da sociedade – até porque “ser atriz” é intrínseco a ela – a bebê que dançava de forma desengonçada dá lugar a uma atriz entregue de corpo e alma, do tipo que não se contenta ser apenas uma, mas todas as suas personagens.

Em 1990, quando Elena se suicidou, o governo havia acabado de interromper a produção de cinema no país. Ela era já muito conhecida nos palcos, mas queria cinema e, portanto, procura refúgio em Nova York, quase como um exílio que também pode ser traduzido como uma espera por algo grande. O fracasso, mesmo em meio a empolgação, traz consigo a perigosa tristeza. A arte entra em conflito com a obsessão da incapacidade, o caos e o ruído não dialogam tão perfeitamente como antes e, assim, a linha tênue entre o suicídio e o equilíbrio, tão presente na vida de um artista, é desfeita.

Elena ingere aspirina com cachaça e morre. Suicídio. Quem é Elena? Um ser humano que buscava o que não se encontra, um segredo, um vácuo que jamais poderia ser preenchido. Uma decisão desperdiçada. Em sua autópsia consta a informação de que o seu coração pesa 300 gramas, mas, metaforicamente, o espectador sabe que pesa muito, muito mais do que isso. Afinal, não existe espaço para estatísticas em obras de arte, elas são imensuráveis.

“O vazio, mesmo quando cheio é pesado demais. O vácuo também preenche, também esgota”

Parte III: O documentário

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A diretora, Petra Costa, afirmou em algumas entrevistas que começou a desenvolver o conceito do documentário após se deparar com o diário de sua irmã. Em um devaneio Petra percebeu que tinha a mesma idade de Elena e, por um instante, parecia que o que estava lendo foi escrito por ela própria. A angústia misturada com a empolgação e o vazio, aos poucos, iam se tornando mais identificáveis.

Petra pode se classificar como afortunada, pois encontrou diversos registros – em áudio e vídeo – da irmã na garagem de sua casa. Através dessas imagens o documentário se desenvolve mesclando as perspectivas, Petra e a sua mãe falam sobre Elena com total conhecimento e, no mesmo tempo, desconhecimento.

Em uma verdadeira contemplação, importante ressaltar que em nenhum momento beira o superficial, uma das primeiras narrações de Petra faz jus a expectativa da família sobre a sua pessoa: “você pode ir para qualquer lugar do mundo, menos Nova York e escolher qualquer profissão, menos ser atriz”. Enfim, Petra vai para Nova York estudar teatro, quase como se quisesse desabafar a ânsia da contradição, como se visse em si a oportunidade de uma nova chance da irmã.

O filme pode ser considerado, por insensíveis, como algo muito particular, egocêntrico ou até mesmo egoísta, ledo engano, na minha opinião se trata de uma experiência universal. Fazendo jus ao sentimento de perda, em qualquer âmbito, de desencontro e de aceitação.

O jovem se afunda facilmente na melancolia, está diante a uma série de decisões que mudaram para sempre o seu destino. Esse momento é conhecido como “período potencialmente crítico”, sendo superado facilmente com o respaldo da família, porém, isso dificilmente acontece; Primeiro porque o próprio jovem se isola; Segundo porque a família muitas vezes trata com desdém os problemas de um “adolescente”.

Aliás, o ser humano é assim, trata de forma indiferente ou inferior os problemas pelo qual ele não está passando. O problema é que a tristeza que conhecemos é apenas a nossa, podemos até tentar nos colocar no lugar de alguém mas, no final, sempre chegaremos as nossas próprias ansiedades.

Petra Costa é corajosa em se expor, no mesmo tempo que o seu trabalho é envolto de uma intenção desmedida: alcançar a comunicação com alguém que já se fora. Curioso é certificar que isso se realiza, através da própria arte. O filme é um elo entre mundos.

Elena foi homenageada, foi resgatada para o agora. Trazida com carinho pela irmã e moldada através das imagens e registro. Elena não gostava da própria letra, por isso “escrevia” cartas com a voz, se certificando de compartilhar suas experiências e novidades. Petra, Elena e a mãe são a mesma pessoa; Ligadas pelo conflito, pelo desejo de morrer, pela tristeza. No mesmo tempo que Petra procura sua irmã, se depara com a verdade de que ela mora em todos os lugares, uma chuva se torna o seu choro, o vento se torna um movimento, os pássaros a sua risada.

Petra, hoje, está mais velha que a sua irmã. Mas como escrevi acima, na arte nada se calcula, não existe idade. Existe verdade. A verdade da Elena é que ela se “sente mais a vontade e natural em frente a uma câmera”. A verdade sobre Petra é que sua sensibilidade é monstruosa e apaixonante. A verdade sobre mim: sou mais um, mas, nem por isso, comum.

Olhos de Ressaca – primeiro curta de Petra Costa – por Emerson Lima

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No final desse lindo filme – o primeiro da diretora Petra Costa – acompanhamos com um sorriso no rosto e algumas lágrimas pedindo licença, os créditos finais. Percebemos que o nome da diretora aparece em vários setores como produção, roteiro e montagem; isso provaria, em outra análise, o quanto é difícil fazer cinema independente no Brasil, restando ao artista abraçar todos os pequenos detalhes da sua obra. Mas após “Olhos de Ressaca” essa afirmação é contraditória; a onipresença por parte da realizadora é quase uma devoção exagerada, uma mãe que abraça a sua arte e, por descuido, a devora.

Petra Costa é uma preciosidade que transita por entre a sensibilidade humana, dialogando direta ou indiretamente com a perda e, na maioria das vezes, consegue achar o brilho na ausência pela sua postura crítica e revoltada diante da normalidade. Ela inverte o normal e agride o tempo, consultando-o como um oráculo mas se desviando constantemente das suas obrigações.

Como documentarista, destaco a sua humanidade que, ligado com a sua visão fotográfica, consegue registrar o eterno de pequenos movimentos; o colorido do preto e branco e a vida da morte. Ela ultrapassa a barreira da vida e cria poesia com a sugestão, faz sorrir com a sua montagem e, por fim, nos relembra da importância do equilíbrio.

Esse documentário percorre a vida de dois seres humanos, casados há 60 anos: Gabriel e Vera. Eles falam como se conheceram, a intensidade, passando pela aceitação até culminar no carinho. Talvez o amor seja esse sentimento profundo de querer bem, simplesmente. Quando o fato de ser casado não atinge mais a obrigação e o “dois” se transforma em “um”.

O título do filme faz referência à um trecho do livro “Dom Casmurro“, onde há uma descrição dos olhos de Capitu como sendo “olhos de ressaca”. Àquele olhar que trás tudo para si, contempla o mundo e o devora. O amor é improvável demais, parte de um desencontro, por isso, é uma sincronia perfeita de ilusões.

Em uma cena, Vera está na piscina e começa a tocar “Valsa para a Lua“, do Vítor Araújo. Exatamente no momento em que ela começa a falar da sua mãe, que falecera. Então é questão de segundos para percebemos que Petra não veio ao mundo por acaso, ela tinha que deixar suas emoções e esperar que outros pudessem entender tanto quanto ela. A brevidade da vida não tira a emoção de viver, mas nos dá humildade para o fazer com calma.

Se alguém apontar o dedo para você e te julgar por conhecer pouco da vida, por ser criança… diga, com todo orgulho do mundo: “eu vi a alma de Petra Costa“.

“olhos de cigana oblíqua e dissimulada.” Eu não sabia o que era obliqua, mas dissimulada sabia, e queria ver se podiam chamar assim. Capitu deixou-se fitar e examinar. Só me perguntava o que era, se nunca os vira, eu nada achei extraordinário; a cor e a doçura eram minhas conhecidas.”

[CINEMA] Elena e a lembrança inconsolável da perda

SITE – deliriumnerd.com – 27 de maio de 2016

 

Elena” é um documentário de 2012 dirigido por Petra Costa, com roteiro da própria Petra e de Carolina Ziskind e produzido pela Busca Vida Filmes.

No documentário, a diretora conta a história de sua irmã Elena, que era atriz e mas que devido a algumas desilusões com a carreira entrou em depressão e cometeu suicídio em 1990, quanto Petra tinha apenas 7 anos.

O documentário conta toda a trajetória de Elena utilizando de depoimentos de familiares, amigos e imagens da câmera que ganhou quando tinha 13 anos. Registros da jovem dançando, brincando de atuação com amigos e imagens da família, principalmente com a irmã mais nova que nasceu pouco tempo depois que ganhou a câmera de presente.

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Elena e Petra

Já um pouco mais velha, Elena começa a estudar teatro no grupo “Boi Voador” e depois decide então ir para Nova York e tentar a carreira de atriz no que mais sonha: o cinema.

Petra Costa é a narradora do documentário e também aparece nas imagens, agora adulta, quando segue pelas ruas de Nova York onde a irmã passou. Tudo isso torna a experiência ainda mais íntima e delicada.

Mesmo tratando de um assunto tão difícil, o suicídio e o vazio da perda, não é uma narrativa pesada, a diretora apresenta as situações de forma poética e isso dá ao filme uma identidade única.

Elena começou a apresentar quadros depressivos na primeira vez que foi para NY e acabou voltando para o Brasil, mas sentia muita falta de atuar, então sua mãe decidiu que ela iria para Nova York com as duas filhas, assim Elena não se sentiria tão sozinha.

A partir daí a mãe de Elena e Petra aparece no documentário para contar tudo o que aconteceu sob a perspectiva dela.

Como a mãe lidou com a perda da filha? E a visão dela sobre como lidar com os sentimentos de Petra que tinha apenas 7 anos na época? As declarações dela são emocionantes.
Mãe de Petra e Elena

Abaixo temos uma entrevista com Tim Robbins e Fernando Meirelles falando sobre a experiência deles ao ver “Elena”, se tiver interesse aperta o play:

Ouvi falar sobre o filme no ano que ele foi lançado e li sobre quando tava fuçando no Filmow, me interessei e marquei que queria ver, mas não consegui ir assistir no cinema.

Passou os anos e em 2015 soube da estreia de “O Olmo e a Gaivota”, outro documentário dirigido pela Petra e também fiquei morrendo de vontade de assistir. Como uma sina, não consegui ver no cinema também (aliás, ainda não assisti, verei e farei uma resenha futuramente), mas lembrei que ainda não tinha assistido o “Elena”.

Um dia estava zapeando canais na TV e descobri que tinha acabado de começar no Canal Brasil o documentário e fiquei assistindo.

“Elena” me impactou de uma forma impressionante e avassaladora. Revi nesta semana e o sentimento continua o mesmo.

É um assunto que todo mundo compreende, já que cada um de nós teve suas perdas e sabemos como isso nos afetou. É isso que o documentário mostra, o impacto que a perda da Elena teve na vida de Petra e seus pais. O filme é um relato emocionante desses sentimentos. No final eu já estava em lágrimas.

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Se pudesse encontrar pessoalmente a Petra Costa certamente diria obrigada pelo belíssimo trabalho com este documentário, por mais que ela tenha nascido devido uma perda tão grande, nunca tinha visto ninguém tratar do assunto da forma que ela fez e fico feliz em ver mais uma mulher dirigindo e ganhando notoriedade no cinema brasileiro.

Parabéns e obrigada, Petra Costa.

“Uma história de fantasmas”

Por Denilson Lopes – Trecho extraído do texto “De Volta à Orgia”

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“Elena” uma estória de fantasmas. Fantasma é Elena, a irmã que morreu, mas também Petra, a irmã que sobrevive e vai para Nova Iorque no rastro de sua lembrança. Fantasmática Nova Iorque feita de pessoas desconhecidas, estrangeiras, aparições fugazes onde Elena não se encontra e onde Petra corre o risco de se perder.

Nova Iorque é Elena . “Elena” (o filme) é uma estória de busca de memórias por parte de uma Jovem mulher que se constrói e de uma diretora se faz artista à sombra da irmã que não conseguiu ser atriz, que escuta a mãe contar a estória do suicídio de Elena e se coloca na mesma cama em que a filha mais velha se matou, na mesma  posição em que a encontrou morta. Mãe e filha reencenam mesmo a perda de Elena não para apagá-la mas para redimensioná-la.

“Elena” é uma estória delicada de amor entre duas irmãs, da mãe que quase se mata após ver a filha morrendo, uma estória de uma linhagem feminina que desconstrói o mito da Ofélia. Não se trata de afirmar o cliché da mulher que se desespera pelo amor nem pela ausência do amor. Aqui não há Hamlet. Há muitas Ofélias, algumas possivelmente morreram, mas outras, muitas renascem a partir das águas escuras de melancolia. Nada aqui é solar.

É uma estória séria de atmosferas sutis, quase sem lágrimas (ao menos na tela) nem gritos. Não há ironia. Mesmo a alegria que surge não como redenção mas, como definia Nietzsche, por enfrentar a vida com toda sua dor. Alegria discreta, sem sorriso final, sem exuberância. Há morte e dificuldade de perder. Mas há aposta na vida com todas suas precariedades.

Se “Elena” refaz o passado, através de uma linhagem feminina, ainda pouco explorada na cinematografia brasileira, esta busca se dá ainda dentro da casa e da família.

Entendemos Elena e nos sentimos compreendidos

por: Daniele França – Trocando o Disco – 5 de fevereiro de 2015

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Olá, primeira postagem aqui no Trocando o Disco e eu gostaria de mostrar um dos últimos filmes que vi e achei de uma extrema necessidade divulgá-lo para a sociedade. Elena é um documentário dirigido por Petra Costa, que conta a história da sua irmã (a qual nomeia o filme) e relata a trajetória desta em busca dos seus sonhos, de se tornar uma atriz de Hollywood e deixar pra trás as limitações que existiam no Brasil. Nesse caminho, ela registra tudo em fitas VHS e envia carta para a família contando de sua rotina e testes que fazia na América. Porém, os retornos dos seus testes não saem como o planejado. Com seus sonhos abalados, Elena se encontra frustrada e acredita não ter talento.

“Meu coração está tão triste que eu me sinto no direito de não perambular mais por aí com esse corpo que ocupa espaço e esmaga mais o que eu tenho de tão… tão frágil.”

A narrativa,precisamente, as palavras e o modo como Petra conta a história foi o que mais me chamou atenção. Os depoimentos da mãe foram essenciais para dar todo um contexto nostálgico e triste ao documentário. O longa é delicado e explora a angústia de todas as partes envolvidas, principalmente de Petra que compartilhou do mesmo sonho que a irmã e se encontra em seu caos particular por começar a entrelaçar a sua vida com a de Elena.

“Elena, sonhei com você essa noite… mas num instante você vira água, se desfaz em gotas, desaparece.”

Ao ler a sinopse, não imaginei metade dos sentimentos que teria ao ver o longa. Confesso que tive uma visão totalmente errada do que se tratava a história. Que bom. Foi o melhor erro que cometi. As reflexões propostas mexem com o seu emocional, e acredito que todos nós passamos por momentos como o de Elena: a criação de grandes expectativas, a frustração… Independente da intensidade desses acontecimentos em nossas vidas, entendemos Elena e nos sentimos compreendidos. Não o verei novamente, acredito que não tenho coragem o suficiente pra isso, mas está marcado nos meus favoritos para me certificar de que eu apreciei de forma inteira uma divina obra de arte. Obrigada, Petra.

Tô dançando com a Lua

Por Ana Carolina – Mesa de Café da Manhã – Fevereiro de 2015.

Delicado desde o seu começo icognitário, passando pelo seu caminhar memorativo, até chegar ao seu final de auto-descoberta. Este é “Elena”.

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Quem é Elena, o ela significa e para quem? Estas são as perguntas que foram levantadas durante toda a divulgação do longa-metragem em documentário nacional “Elena” da artista e cineasta brasileira Petra Costa. A partir dessas questões, você se pega pensando se não seria este mais um documentário falso, que utiliza da sua estética para construir uma ficção enraizada na procura por si mesmo. Mas não.

“Elena” é um documentário. Mas um verdadeiro documentário artístico.

Usando recursos documentais, como entrevistas, leitura de documentos, vídeos de arquivo e muito mais, Petra remonta a figura de Elena para todos nós, ao mesmo tempo em que aproveita para escrever uma carta para sua irmã. Uma carta sentimental, porém verdadeiramente carinhosa de alguém que quer entender o que aconteceu com você, Elena. De alguém que viveu a vida entre idas e vindas de diferentes noções do que poderia ser mais precioso do que a própria vida. De alguém que duvida que Elena tenha noção do que deixou pra trás.

Sim, uma carta, uma película extremamente pessoal, autoral, mas com aquele quê de “deixe-me leva-lo a entender o que aconteceu”, para quem sabe você me ajudar a entender também, de modo que além de um documentário sobre Elena, “Elena” é uma procura pela auto-independência, partindo da compreensão do outro, remontando seus passos e seus momentos mais intensos (sejam eles de pura lucidez, sejam eles de total e completo desespero).

Sim, você fica diferente na frente das câmeras, Elena e por isso mesmo esse filme foi feito para que você pudesse se ver através dela. Vê-se, pela primeira vez, talvez, como você realmente é.

*Importante dizer que eu não quis me alongar muito nesta crítica, porque um dos grandes méritos da história está justamente na descoberta deste ser, juntamente com a autora, de modo que você se deixa passear pela perspectiva criada ali. Deixe-se levar e fluir, como uma dança. Uma dança com a lua.

Mais um filme que se encaixa direitinho no no projeto do Blogs que Interagem de 24 filmes para 2015, na categoria Cinema Brasileiro. Então, mais um filme na lista.

Elena, uma viagem pessoal

Por: Francisco Russo – Vermelho / Adoro Cinema – 5 de junho de 2015

Já há alguns anos parte dos cineastas brasileiros resolveu enveredar pelo caminho duvidoso dos documentários pessoais, onde apresentam fatos ligados à sua própria vida ou de sua família. Por vezes os retratados até contam com elementos atraentes ao grande público, casos de Diário de uma Busca e Marighella, mas em outros nada mais é do que puro egocentrismo sendo exercido com uma câmera na mão.

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“Elena é um filme tocante que ultrapassa, e muito, a média geral dos documentários pessoais.”

A atriz Petra Costa decidiu se arriscar neste meio ao rodar um documentário sobre a irmã, Elena, que dá nome ao seu primeiro longa-metragem. Entretanto, o que se vê na tela é mais do que um mero retrato de um parente, mas uma busca devastadora por alguém que pouco se conhece de fato.

Antes de tudo, é preciso ressaltar que a diretora teve coragem. Nem tanto por fazer o filme, mas por remexer em momentos tão dolorosos que, independente de quem seja, machucam quando voltam à superfície. Isto sem falar do risco em expor este drama pessoal no cinema, permitindo que todos adentrem sua história e possam opinar sobre ela a seu bel prazer.

Mas, tirando todas estas questões que envolvem o lado pessoal, Elena é um grande filme principalmente pelas opções estéticas de Petra Costa. O tom poético nas imagens e na trilha sonora conferem ao filme uma beleza impressionante, impulsionada pela sinceridade explícita demonstrada pela diretora na história retratada.

Sim, pois mais do que simplesmente contar a história da irmã, Elena cria um certo suspense sobre o que realmente aconteceu. Sabe-se que ela não está mais ali e, por mais que como isto tenha acontecido possa ser imaginado, quando a verdade vem à tona é de uma avalanche emocional contagiante.

Outro ponto bastante interessante do longa-metragem é o uso das imagens de arquivo. Importantíssimas para a história apresentada, elas surgem nos mais diversos formatos e sempre com uma narração em off, da própria Petra Costa, apresentando situações de momento ou sensações que ela e sua família tinham na época. Intervenções pontuais de sua mãe, que aparece tanto nas imagens antigas quanto nas atuais, ajudam a posicionar o espectador em relação ao antes e o depois do ocorrido. É principalmente através da narração que a diretora encontrou o ritmo do filme, um tanto quanto pausado, mas essencial para uma melhor compreensão emocional dos eventos apresentados.

Elena é um filme tocante que ultrapassa, e muito, a média geral dos documentários pessoais. Trata-se de uma viagem absolutamente pessoal de Petra Costa em busca de uma irmã que pouco conheceu, mas também um filme de grande sensibilidade no que se refere à transposição para o público dos eventos e o impacto emocional decorrente deles. Um filme para ver, chorar e refletir, sem esquecer.

Só assim para se ter a plena compreensão do que aconteceu e seguir em frente de alma e consciência limpa. Belíssimo, não apenas o filme, mas a postura assumida pela diretora ao encarar de frente o mistério que rodeava sua irmã, Elena.

O filme da filha que entra na China

Fernanda Ramone, organizadora do Doc Brazil Festival – 25 de julho de 2015

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Ao final da busca, ao final do filme sons de sino.
Água e ar, a vida a pulsar.
O movimento no lago
vestido molhado
escama de peixe a nadar.
Cor carmim.
Encontro das águas
encontro das almas
dualidade a instaurar, o oriente sem fim.
Sem fim nem começo,
no escuro do avesso
no claro do par.
Os cinco elementos
o universo a guiar
paisagem bucólica
tradição milenar.
O filme da filha que entra na China
e a China a mostrar
à filha e à mãe o muito que há.

Assisti ao filme em São Paulo, em tempos de jornadas de 2013, de preparação para a edição especial do festival que organizo na China (DocBrazil Festival), país que foi meu lar durante nove anos. Em setembro do mesmo ano, em Beijing me apresentaram para a Li An, nesta ocasião cheguei a comentar sobre a poesia da cena final do filme, que para mim traz referências muito fortes presentes na cultura chinesa.

    Os cinco elementos, a água. O lago que abriga e movimenta a menina de vestido com detalhes carmim como escamas e logo a menina mãe se junta a esta paisagem yin e yang, o céu e a terra, do efêmero e do imortal, do claro e do escuro, da inércia e do ritmo. Imagem que se assemelha a de dois peixes dourados, a dualidade, o dois, retratados constantemente nas pinturas chinesas tradicionais. Carregando o significado da felicidade em função da liberdade proporcionada pelas águas. Da abundância, da comunhão.

Eu vi: Elena, o filme

Ana Letícia – Blog Mineiras Uai – 31/07/2014

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Assisti “Elena”, o documentário de Petra Costa sobre sua irmã, há dois dias. Somente hoje consigo escrever algo sobre o filme, após digeri-lo, ruminá-lo e engolir novamente.

E então chego à conclusão de que, definitivamente, Elena não é um filme para qualquer um, para qualquer hora, e, principalmente, Elena não é um filme para se esquecer. Talvez por isso mesmo que, talvez, Elena não seja um filme para se recomendar. Seu realismo e construção exigem dedicação e sensibilidade do espectador. Não me sinto confortável em escrever esta crônica, como não me senti confortável ao assistir o filme, durante a sessão. Mas ainda assim, não consegui sair da sala de cinema e largar Elena ali, sem minha respiração tensa, sem minha angústia velada.

O filme é sensível, e talvez a sua sensibilidade extrema tenha me atingido como um murro, desses que você lembra dias a fio, como um zumbido no ouvido que não te deixa dormir após uma noitada com som muito alto.

As imagens de Belo Horizonte e as gravações reais exibidas durante todo o filme, bem como o mineirês das personagens – nada ficcionais – me transportaram à BH nos anos 80, quando morávamos na Rua Alto da Mata na Cidade Nova, e eu ainda era tão criança quanto Petra, enquanto sua irmã Elena ganhava os palcos em São Paulo. Se eu fosse 10 ou 12 anos mais velha, provavelmente teria conhecido Elena…

Além da nostalgia do meu próprio passado, gostei das imagens gravadas com uma pequena câmera fotográfica em Nova Iorque, pela própria autora, diretora e personagem real Petra, dando o tom biográfico e, ao mesmo tempo, se aproximando de mim e minha Nikon D3100, meus muitos sonhos e alguns projetos não realizados. Minha amada Nova Iorque jamais será a mesma após Elena, não para mim.

As últimas falas do filme, na voz de Petra, e suas últimas imagens, não me deixarão esquecer de ti, Elena, controversa, dançarina, atriz, mulher.